terça-feira, 5 de fevereiro de 2013


O Bem e o Mal: um enigma para a humanidade.
Mais uma tarefa nos é proposta: refletir sobre o bem e o mal. Muitas ideias me vêm à cabeça num turbilhão e me vejo diante da dificuldade em organizá-las e me pergunto: “Valerá a pena tentar”?
Além do mais já estou próxima em anos de uma nova década e confesso que sentimentos contraditórios de dúvida, tristeza, angústia e alegria me invadem. Assim, alegria pela minha caminhada até hoje, com tropeços e  erros como todo ser humano, mas com muitas coisas boas e muitas realizações. Por outro lado, penso no futuro e me entristeço, ( Será a visão da morte, como escreve Lya Luft, me espreitando, palitando os dentes e preparando o bote? E continua a escritora... “Quando trabalhamos ou nos divertimos, ela passeia pelas praças, sobe nos telhados mais altos e aponta aqui e ali seu dedo ossudo: este, esta, aquela, as várias num só golpe”) e me pergunto tristemente: estarei na próxima leva?
Mas continuo vivendo, fazendo o bem e evitando praticar o mal e me pergunto como no bolero antigo: “Hasta quando? Hasta quando?”.
Mas deixando de lado perguntas para as quais não tenho absolutamente respostas passo a tentativa de refletir sobre o angustiante dilema entre o bem e o mal.
Não se trata de discutir se o mal existe. Isto é um fato. Trata-se de defini-lo. Eis aí o foco do problema, como conceituá-lo?
Platão, filósofo ateniense do IV séc.  A.C, discípulo de Sócrates, assim se exprime: “O Bem é uma ideia ou forma (do grego eidos) que se encontra acima do intelecto humano, tem existência independente da multiplicidade das coisas existentes no mundo e é participada de modo imperfeito por elas (Ramos, p. 14) .  Coisas que existem no mundo sensível são cópias dessas formas que são a realidade em si.
Continuando o pensamento de Platão: “O Bem é a finalidade do homem que quer atingir a sabedoria. O contrário dele, o mal, reside na busca da satisfação dos sentidos. O mal jamais habita na esfera celeste junto aos deuses, mas sim na natureza humana mortal. O corpo é a raiz do mal pois é a fonte dos desejos insensatos, paixões, discórdias, inimizades,guerras, loucura, etc.” (idem p. 15)
Por outro lado, líderes religiosos usam, muitas vezes, nas suas pregações, a figura do ”demônio como a personificação do mal, responsável por todos os males e dotado de poderes incalculáveis para executar a maldade na sociedade”. (idem, p. 10) Durante a vida terrena haverá sempre a luta entre Deus e o demônio e no final dos tempos os pecadores serão condenados e os justos recompensados com a vida eterna e feliz.
Para os maniqueístas (seguidores de Mani, nascido na Pérsia no sec. III), o homem tem uma natureza boa e outra má em constante luta e no final dos tempos o Bem vencerá o mal.
Santo Agostinho, seguidor de Platão, embora já cristianizado, se coloca contrário às ideias maniqueístas negando o mal ontológico.  Para ele, o mal é nada mais que ausência ou carência do Bem. O homem, criatura de Deus, possui o livre-arbítrio que Santo Agostinho entende como bem, que o aproxima do mundo racional e elevado e de Deus, que através da graça, faz o homem escolher o bem. “Há no mal um movimento de distanciamento e perda do homem em relação a Deus, movimento este que é perda do bem.” (idem pag. 32) É o homem que se aproxima das coisas inferiores, das paixões, da vaidade e do orgulho.
E assim Santo Agostinho afirma que o mal não tem valor ontológico, sendo apenas a ausência do Bem, ou seja, “não há um mal existente por si só, que teria tanto grau de ser quanto o bem.” (idem pag. 33)
Essas ideias colocadas resumidamente no presente texto mostram algumas posições, que tiveram, nos séculos posteriores, vários desdobramentos.
É interessante abordar ainda a visão do mal nos tempos atuais. Assim, Zanoni, autor já citado, buscou ainda a ideia central de uma filósofa judia, Hannah Arendt, que aborda o tema do mal no seu livro “Eichman em Jerusalém: um relato da banalidade do mal”. Como já é de domínio público, Eichman, político alemão, colaborador do nazismo e réu acusado de crime de perseguição e morte de judeus, foi julgado e condenado à pena de enforcamento. Arendt, enviada pela revista “The New Yorker” para acompanhar o referido julgamento, se viu em uma posição bastante difícil e desconfortável. Sobre Eichman, obviamente, pesava todo o ódio, desprezo e desejo de justiça de um povo massacrado pelo regime ditatorial e impiedoso de Hitler principalmente contra os judeus e que até hoje nos causa horror, tristeza e “espanto”. Esta palavra foi por mim retirada de um depoimento dado por Ferreira Gullar à revista Veja (26/9/2012). Dentre os assuntos abordados, ele enfatiza que só consegue escrever poemas a partir de um espanto diante da vida; a poesia não nasce somente pela vontade da gente, ela nasce de algo que não se sabe, mas nos provoca. A tudo isso ele denomina “espanto”.
Apesar de tudo, Arendt sabia que seu relato não deveria ser conduzido pelas emoções somente, mas também pela razão. Seu dilema se centraliza na questão: do que Eichman seria culpado?  Da morte de seis milhões de judeus ou de alguns que ele prendeu e levou para morrer? A partir dessas perguntas, Hannah Arendt procurou respostas nos próprios atos praticados pelo réu em questão.
Na avaliação do comportamento de Eichman, Arendt usou a palavra banal para se referir ao mal cometido por ele, isto é, sem profundidade e com ausência de enraizamento em alguma maldade. E assim entende: “o que Eichman tinha de maldade estava nas suas ações e não na sua essência” (idem pag. 39), recusando assim a ideia do mal ontológico.
Sobre o pensamento de Arendt, Hélio Shwartsman, no jornal Folha de São Paulo de 13/05/12, escreve um artigo baseado em um experimento conduzido pelo psicólogo Philip Zimbardo em 1971, que procurou mostrar o comportamento de pessoas que estariam supostamente “presas”. Algumas pessoas se apresentaram voluntariamente diante do psicólogo da Universidade de Stanford para serem submetidas à pesquisa. Por sorteio, um grupo ficou com o papel de guarda e o restante com o de prisioneiro. Os “guardas” deveriam apenas assustar “os prisioneiros”, mas o experimento saiu de controle e os “guardas” foram se tornando cada vez mais cruéis e os “prisioneiros” aceitando cada vez mais os castigos e as humilhações sofridas. Basta uma pressãozinha do grupo para uma pessoa normal se enfronhar na barbárie e julgá-la a coisa mais natural do mundo. É o que Hannah Arendt chamou de banalidade do mal.
Como vimos através de rápidas pinceladas sobre o tema em questão, muitas dúvidas ainda persistem e não se chega a uma conclusão que satisfaça plenamente. Certeza mesmo não existe quando nos referimos à vida na sua fluidez.
Penso que, instintivamente, sabemos que o mal e o bem existem como ações, como comportamentos, julgados de acordo com regras morais, políticas, religiosas que variam de acordo com a época histórica e o grupo social. Ricoeur, por exemplo, não reconhece no homem uma essência má, e sim uma fragilidade que possibilita ao homem a agir mal. Para ele, o mal surge acidentalmente, no decorrer da História.
Todo o mal praticado resulta no mal sofrido por alguém. É o mal moral e por isso quem o praticou deve ser castigado. Antes de buscarmos a explicação fora de nós (deuses ou o diabo) devemos atuar ética e politicamente contra o mal.

Celia





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