quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Tempo e memória

Tempo e memória
Acabara de chegar em casa. Nem bem entrei com o carro na garagem quando a caminhonete estacionou e saiu um rapaz que logo reconheci. Era ele quem viera de manhã entregar o jogo de mesa e cadeiras que eu havia comprado no sábado. Comentei que não sabia como me desfazer da mesa e cadeiras antigas e ele se propôs a me ajudar. Conhecia pessoas que aceitariam ficar com elas. Combinamos que ele passaria mais tarde para levar.
_ Moça,  falei com sua mãe hoje de manhã. Vim buscar a mesa e cadeiras que ela vai doar.
Um pouco surpresa, eu lhe disse que era comigo mesma que ele tinha falado. Ele ficou meio sem graça, mas logo retrucou que ainda bem que me confundira com minha filha. Enfim, em questão de horas consegui remoçar décadas sem recorrer a cirurgia plástica, aplicação de botox ou a qualquer uma das artimanhas que proliferam no mercado dos produtos cosméticos. Contudo, essa simpática confusão criada pelo moço não muda o fato de que já alcancei o status de idosa.
Esse pequeno acontecimento tão banal que vou chamar de engraçado aconteceu há pouco tempo, não me lembro quando. Preciso ver o recibo da compra. Estou numa idade em que a memória (ou a perda dela) é motivo de preocupação. Onde é que estacionei o carro ou será que desliguei o forno são perguntas que não fazia até bem pouco tempo atrás, mas que hoje são recorrentes. Vivemos agora assombrados com o fantasma do Mal de Alzheimer; é o preço que pagamos pelo aumento da expectativa de vida.
Mas não fiquemos desanimados porque Leandro Karnal, com sua habitual e divertida ironia, em sua palestra sobre a utopia da melhor idade, aponta uma saída para isso. É só adotarmos uma dieta à base de pururuca e pastel de feira que a ameaça dessa doença tão comum hoje em dia desaparece.

Enfim, acho que divaguei um pouco na tentativa hercúlea de escrever este texto que pretende ser uma crônica. Porém, se não for, não tem a menor importância. Tenho certeza de que o Estatuto do Idoso me assegura o direito de não saber escrever crônicas.  Afinal estou na idade que pode não ser a melhor, mas que não precisa ser a pior, apesar da terrível dor nas costas que me acomete ao finalizar, como se dizia no meu tempo, estas mal traçadas linhas.
Cristina Saito

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